De um modo geral, as pessoas olham com desconfiança para os políticos e com alguma admiração para os comentadores políticos. Por outro lado, olham com alguma admiração para os futebolistas e com desconfiança para os comentadores de futebol. As pessoas, como sempre, estão erradas. Se alguma coisa distingue os comentadores de política dos de futebol é que os de futebol são melhores. A principal marca dessa superioridade é esta: os comentadores políticos recorrem muitas vezes a metáforas do mundo do futebol para explicar a política, mas os comentadores de futebol teriam justa repugnância em utilizar o jargão político para explicar uma coisa pura e bonita como é o futebol. Além disso, há nos comentadores de futebol uma humildade que os eleva. Jorge Baptista pode criticar Cristiano Ronaldo, mas não ousa acreditar que faria melhor do que ele no campo. Em contraponto, qualquer editor de política que ponha em causa as opções de determinado primeiro-ministro não esconde que, lá no fundo, acredita que seria um chefe de Governo mais competente.
A ingenuidade dos comentadores de política, que contrasta com a frieza experiente dos comentadores de futebol, vem ao de cima em momentos como este. A formação de um novo Governo tem dividido as opiniões: certos comentadores creem que há razões para ter esperança porque as escolhas de Passos Coelho foram boas, outros acham que não há motivo para festa porque as escolhas de Passos Coelho foram más. Uma vez mais, estão todos errados. Este Governo não vai fracassar apesar das boas escolhas ou por causa das más escolhas. Este Governo vai fracassar porque é um Governo. E, ainda por cima, é um Governo de Portugal. São logo duas circunstâncias funestas.
No futebol, compreende-se mal que haja euforia antes do início do campeonato. Na política, não se compreende de todo que haja euforia antes do início de uma legislatura. Ao menos, no fim de um campeonato, haverá sempre um campeão. No fim de uma legislatura só tem havido ressentimento e desilusão. E, sendo o mesmo tipo de ressentimento, custa a perceber de que modo é que continua a gerar euforia. Dou um exemplo: neste momento, há comentadores que depositam grande esperança no novo Governo de coligação entre PSD e CDS. No entanto, da última vez que PSD e CDS se juntaram para governar, o eleitorado ficou tão satisfeito que, na primeira oportunidade que teve, deu uma maioria absoluta a José Sócrates. PSD e CDS foram tão maus que fizeram Sócrates parecer excelente. Depois, Sócrates foi tão mau que fez PSD e CDS parecerem salvadores. Há comentadores políticos que ainda caem nesta esparrela. Rui Santos nunca cairia.
Claro que há dois ou três aspetos positivos no novo Governo. O primeiro é que o partido que venceu as eleições está em minoria no Governo. Em 12 ministros tem 5, contando com Passos Coelho. Pode ser uma inovação interessante. O segundo é que, com a nomeação para primeiro-ministro, Passos Coelho conseguiu finalmente obter um emprego sem ser numa empresa administrada por Ângelo Correia. Aqui está o que pode ser uma inspiração para os desempregados. Com tempo, esforço e sorte, podem arranjar um emprego sem cunhas. Basta que, quando concorrerem a determinado posto de trabalho, o outro candidato ao lugar seja José Sócrates.
Sem comentários:
Enviar um comentário