segunda-feira, 20 de junho de 2011

Autoridades portuguesas admitem usar ficheiros de música para caçar piratas na Net


No final de 2010, a IGAC e a AFP anunciaram um acordo que visava a aumentar a eficácia do combate à pirataria nos Sites de Partilha de Ficheiros (P2P) em Portugal. Um comunicado do Ministério da Cultura revelou , na altura, que o protocolo previa o recurso a software para a deteção de pirataria, mas não referia o uso de ficheiros de música pelos investigadores da IGAC quando se registam nos P2P com o objetivo de detetar casos de partilha de música pirata.
André Rosa, fundador do Partido Pirata Português (PPP), insurge-se contra a distribuição de músicas nos sites P2P pelas autoridades: "A partir do momento em que a IGAC coloca ficheiros de música nesses sites, como é que pode dizer que outros internautas fizeram ou não o download ilegal dessas músicas?".
Na origem da polémica está a alínea b da cláusula quarta do protocolo assinado pela AFP e a IGAC .
Inquirido pela Exame Informática, o  responsável do PPP admite que nunca deparou com um honeypot (nome dado na gíria à colocação de ficheiros para atrair ou facilitar a identificação de internautas) nos P2P. "Não posso dizer que alguma vez vi um honeypot, porque é quase impossível distinguir se um ficheiro está a ser distribuído como honeypot ou não", acrescenta.
A braços com a recolha de assinaturas para a constituição de um partido que defenda a livre partilha de ficheiros e a privacidade dos internautas, o PPP alega que o protocolo foi mantido em segredo e que só depois de apresentar queixa à Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos (CADA) conseguiu aceder ao documento.
"Para já estamos a analisar juridicamente o que se pode fazer com este caso", refere  André Rosa.
Eduardo Simões, diretor-geral da AFP, confirma que o protocolo contempla o uso de músicas por parte das autoridades que investigam os P2P, mas nega que estes ficheiros sejam usados como isco de internautas que descarregam pirataria: "Estes ficheiros de música apenas são usados para chegar a velocidades de download maiores dentro dos P2P. Não é só em Portugal que se faz isto - estes métodos são usados em muitos outros países. No caso da AFP, só enveredámos pelo uso de música nos P2P, depois de garantir que não havia qualquer impedimento do ponto de vista jurídico".
Em 2006, a AFP usou um método idêntico para fazer uma ronda por P2P. Dessa investigação realizada por "conta própria", resultaram 38 queixas de pirataria na justiça portuguesa.
Eduardo Simões lembra que "ao contrário de quase todos os outros utilizadores dos P2P, a AFP era única que tinha autorização dos criadores, produtores e editores para distribuir as músicas naqueles sites. Apesar de recorrermos a esse método, nunca usámos como prova o download das músicas que nós disponibilizámos".
O responsável da AFP nega qualquer ilegalidade no uso de ficheiros de música durante as investigações efetuadas aos P2P: "Nas 38 queixas que apresentámos em 2006, estes métodos foram descritos detalhadamente.  O que não impediu o Ministério Público de aceitar estas provas no único caso em que houve uma pessoa condenada por pirataria na Net".
Apesar de defender que o combate à pirataria na Net só se tornará eficaz com a mudança das atuais leis, Eduardo Simões rejeita qualquer conflito moral na disseminação de músicas pelos investigadores que têm por missão caçar piratas na Net: "Moralmente questionável é a violação massiva dos direitos de autor na Net".
A Exame Informática contactou a IGAC, mas não obteve qualquer resposta ou comentário até à hora da publicação deste texto.

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