Reggae = a Bob Marley. Ainda hoje, mais de 30 anos passados, não há quem não saiba cantar “No Woman, no Cry” ou não dance alegremente ao som de “Could you be Loved”. A sua carreira musical começou em 1962, quando gravou dois singles “One Cup of Cofee” e “Judge Not”, sob o pseudónimo Bobby Martell. Nem o nome, nem as canções tiveram sucesso. Em 1963, cria os The Teenagers, juntamente com vários amigos entre os quais Bunny Wailer e Peter Tosh, que mais tarde viria a chamar-se The Wailers. Entre falhanços musicais, falta de dinheiro e viagens a Londres, a banda começou a sua ascensão em 1972, com o produtor Chris Blackwell, da Island Records, que procurava uma forma de mostrar a musica jamaicana ao mundo. Quando Bob Marley entrou no seu escritório, Blackwell viu nele um futuro ícone. “Catch a Fire” foi o primeiro álbum gravado com esta editora e os The Wailers a primeira banda reggae a ter tratamento 5 estrelas em estúdio. As vendas não foram suficientes para transformar Marley numa estrela, mas interessou os críticos. “Burnin’” foi o segundo álbum, que incluía aquelas que são ainda hoje um sucesso: “Get Up, Stand Up” e “I Shot the Sheriff”, que nem a Eric Clapton passou despercebida. Apesar de em 1974 ter perdido Tosh e Bunny, continuou a gravar como Bob Marley and The Wailers. Em 1975 chega o sucesso internacional com a música “No Woman, No Cry” do álbum “Natty Dread”. Seguiu-se “Rastaman Vibration”, de 1976, que passou quatro semanas no top 100 da Billboard, nos EUA. Marley gravou 11 álbuns, sete de estúdio e quatro ao vivo. “Uprising” foi o seu último álbum gravado em estúdio (1980). A revista “Time” elegeu “Exodus” como um dos melhores álbuns do século XX.
As mulheres
É aqui que a coisa fica complicada. É que Bob Marley tinha muito amor para dar. Tanto que pelo menos 11 filhos carregam o seu apelido. Vamos por partes. Rita Marley, esposa amantíssima e legítima desde 1966, que com ele ficou até ao fim (e que dele herdou todos os bens) foi mãe de cinco dos seus filhos, dois dos quais adoptivos: David ‘Ziggy’, Stephen, ambos músicos, e Stephanie. Sharon e Cedella, de um relacionamento anterior de Rita Marley, foram criadas como filhas de Bob Marley. De um romance com Pat Williams teve Robert ‘Robbie’. E vão seis. Janet Hunt foi mãe de Rohan Marley, que nasceu no mesmo ano que o seu irmão anterior. Rohan foi jogador profissional de futebol americano e é o pai dos cinco filhos da cantora Lauryn Hill. Ainda não se perdeu? Óptimo, vamos continuar. Segue-se um romance com Lucy Pounder de onde nasce Julian, também músico e seguidor do movimento Rastafari. 1976 foi o ano de Anita Belnavis, mãe de Ky-Mani Marley e campeã de ténis de mesa. Calma, só falta um (oficial). Damian Marley é filho de um romance assolapado entre Bob Marley e Cindy Breakspeare, uma modelo canadiana que, em 1976, foi Miss Mundo e para quem Bob escreveu “Turn Your Lights Down Low”. Rita não pareceu importar-se muito com esta faceta do marido, continuando, ainda hoje, a promover o seu legado. Foi ela que decidiu tornar a sua casa no Museu Bob Marley, na Jamaica, e é a criadora de uma série de fundações não governamentais e não lucrativas com o nome do marido. Rita, que era cantora e membro dos coros de The Wailers, chegou a editar alguns álbuns em nome próprio.
A política
Quase todas as canções de Bob tinham uma conotação política e religiosa. Além de ser adepto do movimento Rastafari, criado por Hailê Selassiê I, imperador da Etiópia, e a representação terrena de Jah (que é basicamente Deus). O movimento foi criado na Jamaica, nos anos 20, pela classe trabalhadora e defende, entre outras coisas, como o êxodo de todos os africanos para Zion, na Etiópia, o consumo livre de marijuana. Explicada a parte religiosa, cujos vocábulos (Jah, Zion ou Babylon – que representa tudo o que vai contra as palavras de Jah) encontra em várias canções de Marley, avancemos para a política. O músico era um defensor da paz e impulsionador de concertos gratuitos para promover o amor entre povos e facções políticas. Em 1976, dois dias antes do concerto Smile Jamaica, organizado pelo Primeiro ministro da ilha, Michael Manley, numa tentativa de acalmar os conflitos entre dois grupos políticos rivais, Bob Marley foi baleado em casa, juntamente com a mulher Rita e o manager Don Taylor. Nenhum sofreu ferimentos graves e Bob Marley subiu ao palco, como estava planeado, dizendo: “Se as pessoas que estão a tentar fazer do mundo um sítio pior não tiram folga, como posso eu fazê-lo?”. É mítico o concerto One Love Peace em 1978, na Jamaica. Bob conseguiu juntar em palco os rivais políticos Michael Manley, líder do People’s National Party, e Edward Seaga, do Jamaica Labour Party, que acabaram por apertar mãos. Em 1979 é editado “Survival”, considerado a sua obra mais crítica e política com canções como “Zimbabwe”, “Africa Unite”, “Wake Up and Live”, que reflectiam o apoio de Marley à luta africana contra o Apartheid na África do Sul.
O legado
Ora com 11 filhos legítimos e mais uns três a usar o seu apelido mas não reconhecidos pela família, seria de esperar que algum iria fazer carreira na música. Não foi um, foram vários. David ‘Ziggy’ Marley, 42 anos, canta como o pai e passa mensagens de paz através das letras. Tem um extenso repertório que vem desde 1985 e já ganhou cinco Grammy. É activista e líder de uma ONG. Damian ‘Jr. Gong’ Marley, 33 anos, é o filho mais novo de Bob. Foi ele que esteve dia 14 de Abril no Pavilhão Atlântico, em Lisboa. Ganhou três Grammy. Stephen, 38, faz parte da banda do irmão mais velho Ziggy, os Melody Makers, e foi produtor dos três álbuns a solo de Damian. Da banda fazem parte Cedella e Sharon, duas das filhas de Bob. Assim de repente já temos cinco filhos músicos. Avancemos. Julian Marley, 36 anos, é músico de... surpresa, reggae. Tem três álbuns editados. Ky-Mani, andou uns tempos dividido entre o futebol e a música, acabando por se render à arte. O seu som, para além de reggae, tem base no hip-hop e sons mais urbanos. Mas o legado de Bob Marley, estendeu-se muito além dos filhos. A verdade é que foi Bob que mostrou o reggae ao resto do mundo. Foi ele que o tirou da Jamaica e o transformou num som universal, repetido e imitado um pouco por todo o lado. Com a sua morte, assim como Che Guevara, veio o comércio: bandeiras, posters, T-shirts, bolsas e bolsinhas de quatro cores (vermelho, preto, amarelo e verde) usadas com orgulho por esse mundo fora. Tal como as rastas, que proliferaram para lugares inesperados onde toda a gente é loira e alva.
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